*Rosa Malena Gehlen Peixoto de Oliveira
A nova Lei dos Seguros, a Lei 15.040/2024, publicada no Diário Oficial da União de 10 de dezembro de 2024, representa um marco histórico para o setor de seguros no Brasil.
Após duas décadas de tramitação no Congresso Nacional, a nova lei inaugura um microssistema jurídico que regerá todas as modalidades de seguro.
Com isso, o capítulo XV do Código Civil, que trata dos seguros, é oficialmente revogado e os contratos de seguro passam a ser regidos por regras próprias, tanto de direito material, quanto de direito processual, abrangendo desde a proposta inicial até a formação e execução do contrato, com todas as implicações jurídicas e práticas decorrentes.
Esse novo conjunto normativo disciplinará, portanto, as fases pré-contratual, contratual e pós-contratual de um dos contratos mais singulares do Direito, atendendo às necessidades contemporâneas do mercado segurador, promovendo segurança jurídica e incorporando elementos do direito comparado, em sintonia com práticas internacionais.
Embora traga inovações, a nova lei preserva elementos consagrados ao longo dos séculos: protege interesses legítimos contra riscos predeterminados; exige probidade e boa-fé das partes; determina que o não agravamento do risco é condição para manutenção do contrato; e reforça a obrigatoriedade de minimizar as consequências do sinistro sempre que possível (duty to mitigate the loss).
Mudanças mais significativas
As alterações mais notáveis trazidas pela Lei 15.040/2024 incluem:
a) A obrigatoriedade de a seguradora especificar claramente e taxativamente quais riscos e interesses estão excluídos;
b) A impossibilidade de extinção unilateral do contrato de seguro pela seguradora;
c) O agravamento do risco pelo segurado será caracterizado apenas quando houver intenção de agravar o risco de forma relevante, conduzindo a um aumento significativo e continuado da probabilidade de realização do risco;
d) O questionário de risco deve ser disponibilizado pela seguradora, indicando quais informações são relevantes para a subscrição do risco;
e) Por outro lado, o questionário a ser respondido pelo segurado proponente deve abordar tudo que ele considerar relevante segundo as regras ordinárias de conhecimento, observando o dever de informar que lhe incumbe, sob pena de perda da garantia;
f) O comportamento culposo ou doloso do segurado implicará consequências distintas para variadas situações específicas descritas na lei;
g) O prazo da seguradora de recusar propostas foi elevado para 25 dias, embora seja possível prestar garantia provisória do risco;
h) Em caso de sinistro, a seguradora deve ser prontamente avisada, portanto, de aviso deverá ser imediato, sob pena do direito à indenização;
i) No tocante ao prazo de regulação e liquidação do sinistro, que pode ser suspenso por no máximo duas vezes, é, em regra, de 30 dias, pois a Susep está autorizada pela lei a estabelecer prazos maiores para questões complexas, até o limite de 120 dias. A não observância destes prazos acarretará perda do direito da seguradora em recusar a indenização.
j) O relatório de regulação e liquidação do sinistro passa a ser considerado documento comum ao segurado e à seguradora, assim como os documentos produzidos que substanciem eventual negativa deve ser entregue ao segurado;
k) Reconhecido o direito à indenização em quantias parciais a pagar, a seguradora deve efetuar adiantamentos por conta do pagamento final;
k) O valor da indenização reconhecida deve ser pago em até 30 (trinta) dias;
k) A mora da seguradora implica o pagamento de multa de 2%, juros moratórios e correção monetária, além de eventuais perdas e danos.
Impacto nos Seguros de Transporte
No segmento de seguros de transporte, as mudanças serão particularmente significativas.
Há inúmeras questões ainda a serem melhor detalhadas, mas uma coisa é certa: a nova Lei 15.040/2024 e a recente Resolução CNSP 472/2024 alterarão substancialmente os seguros obrigatórios dos transportadores.
Nesse tocante, a nova lei de seguros referiu-se aos seguros obrigatórios determinando que devem ter conteúdo e valores mínimos, a fim de que a sua função social seja cumprida.
Inclusive, já escrevemos e publicamos um artigo sobre a Resolução CNSP 472/2024, abordando vários aspectos relacionados aos seguros de responsabilidade civil do transportador rodoviário de cargas. Para consultá-lo clique aqui.
Conclusão
O novo marco legal dos seguros transformará o mercado de seguros, seja sob o aspecto técnico-jurídico, seja sobre aspectos comerciais. Com um conjunto de normas contemporâneas e específicas, o marco legal traz avanços importantes e novas oportunidades, mas também novos desafios contratuais e regulatórios.
Essas inovações exigirão adaptações por parte das seguradoras, bem como por parte dos segurados, sobretudo, quando empresas, de modo a se compreender a nova dinâmica estabelecida.
Nesse sentido, o suporte de especialistas será indispensável para assegurar conformidade com as novas regras e promover uma gestão eficiente e segura dos riscos e interesses seguráveis, garantindo o êxito pretendido.
Sobre a Autora
Rosa Malena Gehlen Peixoto de Oliveira é Advogada e Corretora de Seguros. Diretora Técnica da ARTUS Consultoria e Corretora de Seguros. Especialista em Compliance pela PUC/MG; em Direito Empresarial pelo UniCuritiba; em Direito Processual Civil, pela PUC/PR; e em Direito Aplicado pela EMAP/PR. Autora de artigos jurídicos e coautora do livro “Temas Direito Civil Contemporâneo” (2024) publicado pela Atena Editora. Membro da AIDA – Associação Internacional de Direito de Seguro, seção Brasil. Certificada em Gestão de Riscos, ISO 31000 Risk Management Professional C-3100 pelo G3100 Risk Institute.